Um fantasma e uma tatuagem.
Um dia ouvi dizer que o diabo comprava almas. Não pensei
duas vezes, tamanha a minha já então latente desilusão. Fui direto para as ruas
tentar vender a minha. Procurei por ele em todos os lugares que falaram que ele
morava. Alimentei todo o meu ódio na
esperança que um dia a gente topasse por aí numa esquina. Mas só encontrei o amor. E essa foi a minha
ruína.
Talvez tenha procurado nos lugares errados. Passei pelos
prostíbulos e percebi que as putas também amam. Passei pelos bares e percebi
que são apenas pessoas que não encontraram nada. Corri pelas ruas e vi pessoas
querendo que fossem encontradas. E nunca são. Fui estudar com um bando de feios e fiz amizade com todos eles. Só encontrei amor.
Desisti finalmente da
minha busca implacável pelo mais belo feio e me rendi aos encantos efêmeros
da futilidade. Esses sim, verdadeiros sedutores. Ao desistir da minha busca
pelo mal acabei encontrando o amor e isso sim foi a minha ruína. Tava disposto então a esquecer meus pesadelos
no meio da madrugada e viver um vida normal. Um bilhete bastou. O brilho do
maldito olhar que nunca mais me deixou em paz. Todos os sonhos enlatados
finalmente aparecem. Filhos, uma casa no campo para os finais de semana. Oito
mil metros pensando nela em queda livre. Um fantasma e uma tatuagem.
Oito mil metros se
passam em oito minutos, oito meses. Um ou dois a mais de lágrimas. Se foi e
tenho certeza de que nunca mais voltará. Todos os dias penso nela e venho
admitir publicamente que sinto uma pequena dor. Mas é disso que os homens
gostam, de sentir dor. Uns sentam em um bar, outros não se sentam nunca apenas
para esquecer. E eu prefiro sentir a minha dor todos os dias assim. Só por
saber que no final das contas os pesadelos na madrugada continuam, mas
são pesadelos de amor.
Descobri então que finalmente encontrei o diabo. E que
naquele bilhete assinei o meu contrato vendendo a minha alma. E nunca mais
teria paz, nunca mais. Qualquer olhar, qualquer seio será sempre uma lembrança.
E quando desisti de procurar foi quando encontrei, pra sempre. Tento fugir, mas
quando penso que consigo algo me traz de volta e perco novamente o sono. Procuro em todos os carros da rua, em todas
as garotas. Na esperança de olhar novamente naqueles malditos olhos que brilham
e perceber que não há mais magia alguma, é apenas uma ilusão. E quem sabe poder
ser livre novamente. Mas, acho que não.