Almôndegas - "Almôndegas"
Não obstante, é sobre outra grande ironia que pretendo discorrer na resenha de hoje. Os protagonistas dessa história de contradições são um conjunto das longínquas terras de Pelotas – e peço maturidade, querido leitor – cujo nome revela o teor altamente descontraído e natural de suas letras e filosofia de vida: Almôndegas. Pra quem não conhece, essa foi a primeira banda de Rock/MPB dos irmãos Kleiton e Kledir, famosos posteriormente por sua carreira como uma dupla. E não, eles não tocam música sertaneja, para a tristeza de muitos e minha profunda alegria.
“Mas onde está a ironia nisso tudo?”, pergunta-se o curioso internauta. A resposta é simples: uma das mais fortes características do grupo gaúcho era justamente a profunda aversão ao progresso e à modernidade, incluindo, é claro, a tecnologia, meio pelo qual eu tive o grande prazer – e agora você também, espero eu – de entrar em contato com essa música tão rica e arraigada à cultura gaúcha.
O álbum já começa com uma ode à vida simples no campo, “Sombra Fresca e Rock no Quintal”, talvez a faixa que mais aceite o rótulo de “Rock Rural”, estilo atribuído aos Almôndegas por muitos críticos – embora, em minha opinião, elementos da MPB predominem no trabalho deles, ao menos neste disco de estréia. Assim como a primeira faixa, a terceira e mais genial composição do disco, “Teia de Aranha”, parece ter sido cunhada por JJ Veiga, tamanha a ojeriza provocada na banda por quase tudo o que pode ser conectado à tomada. “Sou humano, mas namoro um computador / O progresso engoliu a nossa paz / E a teia engoliu a própria aranha”;
Ainda nesse espírito, a faixa “Almôndegas” trata do mesmo tema, só que dessa vez de forma mais bem humorada, utilizando-se de linguagem caipira e lógica simples, do tipo “Pra quê comprar Lamborghini se tem perna pra andar?”. Confesso, leitor, que eu responderia a essa pergunta sem grandes dificuldades.
“Olavo e Dorotéia (Uma Louca Estória de Amor)” é outra composição que merece destaque. Uma canção de belíssima singeleza, apesar do título um tanto piegas – odeio essa palavra, mas contento-me com ela no momento. Digna de nota também é “Daisy, My Love”, mais uma letra sensacional do grupo, unindo espírito crítico a humor.
Poupo meus internautas do enfado de um texto deveras longo – a recente profissão de publicitário vem me ensinando a importância da síntese – e já me despeço por aqui. Recomendo fortemente o álbum a quem deseja um pouquinho de cheiro de mato e bosta de cavalo impregnado nos muros de concreto da cidade, mesmo que somente pelos breves 33 minutos de duração do disco. Ou, se o ouvinte for um pouquinho espírito de porco, colocará o bucólico disco dos Almôndegas para tocar em seu “Lamborghini”. Prometo que não conto nada pro Kleiton. Nem pro Kledir. Até a próxima!