domingo, 17 de outubro de 2010

Como sempre fiz

Fui criticado por não conseguir escrever duas linhas sem citar um outro autor, uma música ou ainda uma frase que já usei. Acendo um cigarro, não tão melancólico quanto outrora e percebo que realmente é verdade. Nada que escrevo é meu de fato, de direito. Por mais que o momento seja meu, meus dedos tremem de vontade de sair citando músicas e frases que se encaixam no contexto. Por vezes não fazem sentido algum. Ou por vezes não é pra ser entendida por todos, ou por ninguém. O fato é que infelizmente, eu não sei escrever.

Sou uma cópia de letras e poesias e sofrimentos alheios, como um Lego textual. Como uma porção de recortes, daqueles que você fez cortando as letras coloridas da revista de moda da sua mãe pra mandar um bilhete pra menina mais bonita da sala. Se me pedir pra escrever uma receita do macarrão que eu mesmo inventei, é bem provável que ganhe trechos de Agagê e ganhe forma de música não gravada com palavras clichês copiadas de algum cancioneiro.

Estou sempre martirizando e torturando o papel com verbos que já foram conjugados em outros pergaminhos, por outras pessoas. Às vezes penso que a caneta irá se mover sozinha, por que até ela já deve ter decorado ou sabido o trecho adequado a tal situação ou protótipo textual. E eu não sei usar os porquês.

Bato a cinza do Lucky e reflito: será que eu estou no curso errado? Deveria eu estar fazendo contas ou discutindo a Teoria do Princípio da Incerteza de Heisenberg? Pelo menos, eu teria a certeza de que não sou original e não me decepcionaria tanto. Quem sabe...

Guardo o papel listrado num bolso, a caneta Bic e o isqueiro no outro. Paro num ponto de ônibus e espero, como um sujeito qualquer, como um mortal qualquer, como o que sou. Fosse eu imortal, não estaria numa esquina qualquer, esperando um caixote metálico qualquer. Isso é tema pra outra E-storia. Agora é chegar em casa e copiar, como sempre fiz.

3 comentários:

Rafael Rabelo 18 de outubro de 2010 às 11:01  

"Eu roubei esses versos, como quem rouba pão. Com a mão urgente, com urgência no coração. Eu contei stórias, inventei vitórias, como quem tem preguiça, como quem faz justiça, com as próprias mãos" A Conquista do Espenho - Engenheiros do Hawaii - GLM - 1992

Zé Bokinha 19 de outubro de 2010 às 11:30  

Essa viadagem toda é a prova cabal de que Jornalismo é a profissão para que você nasceu.

Pedro Henrique Malta Martins 23 de outubro de 2010 às 17:04  

Fera, a percepção que você tem e o conhecimento da lingua que você tem para fazer as citações certas, no momento e contexto certos são mais do que provas de que você sabe escrever. É seu estilo.
E eu acho "Tr00"

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