sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Amável Alice.


Quarta feira, numa dessas capitais de alta densidade urbana, sete e meia da noite.


O ano? Dois mil dez e alguma coisa.


Já vem a noite de um dia comum de primeiro semestre, chegado cedo e rápido. Não são nem oito horas e já está completamente escuro. Olho para baixo e vejo carros, atolados em pequenos engarrafamentos, as luzes dos primeiros letreiros nas suas primeiras horas, buzinas e aquele cheiro nauseante de fumaça de automóveis. Ônibus lotados e pontos cheios. Luzes por todos os lados. Camiseta larga e velha do AC/DC, só de calcinha. No som tocando Beethoven.

Um dia chato pacaralho, acordar cedo, faculdade, trabalho, voltar pra casa e ter a companhia da minha própria solidão. Olho para a minha tatuagem do braço direito, penso em conversar com ela. Acho melhor não. Olho para o céu, as estrelas paradas, não estão em movimento e não estão voltando do trabalho. Vou até a prateleira e pego um dos meus álbuns prediletos, dos Beatles, the Magical Mistery Tour. Coloco pra tocar. Tiro a camisa, apago a luz e deito no chão do meu apartamento e apenas escuto a viagem mágica de alguns gênios de 50 anos atrás.

Algo me chama. Me levanto, vou para a prateleira da minha cozinha, pego a maconha, preparo para uso, enrolo o cigarro e novamente me deito no chão da minha sala. O ambiente é perfeito, uma velinha pseudo intelectual acesa ao som de "Blue Jay Way ". A psicodelia já começa a me envolver e a tomar conta de mim. O som místico que vai e vem já começa a tomar conta de mim antes do efeito da droga. Mas mesmo assim acendo, apago a vela e dou a primeira tragada. A melhor.

Meia hora já se passou e ainda estou no chão do meu apartamento. De repente sinto uma grande explosão de energia no meu ventre e um aparente formigamento começa em minha espinha. Não consigo sentir a minha boca. Viro para o lado no chão e mudo o álbum no som, acho que vou ouvir Sgt.Pepper's. Vou direto para Lucy in the Sky with diamonds. Não há barullho de carros lá fora, não há roupa nenhuma prendendo meu corpo, não sinto minha boca, uma explosão energética desce pela minha medula 3 vezes por segundo. Me envolvo na atmosfera também mágica dessa música atingindo o ápice no refrão. Começo a dançar de forma esquisita, mesmo mole, dopada no chão.

Mas aí algo corta meu barato, uma luz no meio da escuridão de um celular vibrando ao som de Engenheiros, minha paixão de adolescência. Pensei que era meu editor confirmando a pauta de amanhã, mas era meu ex namorado. Não atendo. Passam 30 segundos chega a mensagem: 'Pô Alice, não vai atender mesmo?'


Próxima música, agora já não sinto minhas pernas. Volto para a segunda música do Sgt. Pepper's. E encho o apartamento ao som de minha voz, sem contas, sem poluição, sem politicamente correto, sem amor. Como uma represa turbulenta que de repente as águas se acalmaram. E canto: 'I get high with a little help from my friends!'

Não, não vou atender.

3 comentários:

Unknown 18 de dezembro de 2009 às 10:23  

Alice, eu tô treinando pra te enfrentar tenho mil motivos pra você me suportar.(8)

entao...vc nao fez jogo com talvez, eh vc mesmo?haha
mas vc usou ambientes pequenos, drogas baratas, musicas antigas e um ex relacionamento, entao eh vc.

vc ta ficando bom nisso.pensei que sua fase de terceiro anista nao ia passar haha

Leandro Gel 18 de dezembro de 2009 às 10:47  

Doido!
Bom texto, Plínio.

Henrique Napolião Barreto 18 de dezembro de 2009 às 13:55  

tesão!
Por mais que a gente mude... e chegue a pensar que estamos conformados com a poluição, em todos os sentidos, do nosso dia-a-dia curto nessas grandes cidades, sempre haverá uma alice dentro da gente!
Doce e amável... com alguns ex-namorados...

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