segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

E o tempo está no pensamento




Chego em casa. São sete e quinze da manhã. Completamente cansado, mas sabendo que dificilmente conseguirei dormir. Mesmo com chuva. Eu tô com os pés no chão e a cabeça lá na lua. Na rua, na lua, na nasa, em casa. Menos no sono. Meus calcanhares doem como se eu carregasse o mundo nas costas. Eu me deito e não consigo mais me levantar. Puxo um caderno, uma bic azul e começo a escrever bobagens.

'São Paulo, 14 de dezembro de 1977. Escrevo essa carta com a intenção de mostrar a quantas anda minha vida de casado. A quantas anda minha vida fora daí. Não sei por onde começo... Talvez pelo princípio.

Quando me referi a vida de casado, não foi uma reclamação, muito pelo contrário. Acordo todos os dias pensando nela e motivado por estar casado com alguém que eu ame tanto. E quando eu vejo o narizinho dela furando o vento frio de Sampa, me arrependo de não ter me casado com ela antes. Mas talvez eu tivesse perdido uma fase da minha vida. Mas... É, sim, estou feliz.

Mudei de casa! Agora moro na Santo Agostinho, perto do Palestra. Ótima casa, portão branco, de grade, lado da sombra, jardim de inverno, lavanderia, garagem... Taco nos quartos, esquadria de alumínio anodizada... Muito boa. Ah, e a garagem agora é preenchida por um Corcel 73. Amarelo, em bom estado. Eu queria mandar fotos, mas demoram semanas para ficarem prontas. Não consigo entender essa demora. Acho que nasci em época errada. Ou que apareci em época errada.

Bem, é isso. Abraço a todos, mandem notícias, e já sabem que podem (e devem) vir me visitar, em breve. Envio-lhes também o disco 'Meus Caros Amigos', do Chico Buarque. Acho que vão gostar. Saudades, fiquem com Deus. '

Pego as bobagens que escrevi com a bic azul, amasso e jogo pela janela. Na chuva. Sinto a ferrugem, telefone continua calado. Vou buscar um whisky e alimentar mais ainda minha solidão. Eu vou acordar o vizinho, eu vou riscar os corpos, eu vou te telefonar e dizer que eu só preciso dormir. O telefone só toca quando a mente fantasia. Puxo um cinzeiro e...

...Penso em você como há muito não pensava em alguém. Talvez perca o emprego, talvez a sua resposta seja não. Mas eu não me importo. Só quero ter você do meu lado. Eu sei que não é sempre que a gente encontra alguém que faça bem e nos leve desse temporal. E eu quero mesmo que você jogue tudo pro alto. E se cair, eu te seguro. Quando o olhar é natural... Não há como evitar.


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