quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Quadrinhos Urbanos


Uma quitinete. Uma mesa com uns livros do mestrado abertos e alguns rabiscos. Fósforos de um motel de 10 reais. Cigarros. Marlboro, vermelho ou de palha. Uma televisão velha e um frigobar vazio. Sapatos pelo chão e roupas sujas. Algumas revistas em quadrinhos, alguns livros e discos. Um pôster velho caindo do meu time na parede. Tudo isso na Zona Central. Poderia ser em Buenos Aires, Porto Alegre, São Paulo ou Curitiba. Ouvindo pampa no walkman, ouvindo sampa no walkman. Poderia ser passado Gael García Bernal, poderia ser Casablanca com Humphrey Bogart, ou perdido na tradução com Scarlet Johanson. Pink Floyd sem Roger Waters, Gessinger & Leindecker sem o Maltz. Mas sou eu. Ou seja, quase a mesma coisa. No táxi que me trouxe até aqui, Fernanda Takai me dava razão: "A necrofilia da arte. "

Carrego vocês sabem a sina de ser medíocre. Se não bastasse fingir que sinto, além das dores tenho que tomar emprestado as expressões. As palavras, a música, também as lágrimas porque essas não as tenho. Ouve um tempo em que ir para o Serra Dourada me dava um frio na barriga. Inferno verde, os velhos cheirando cerveja e o sol rachando na testa. Hoje isso já é normal. Houve um tempo em que fumar era interessante. E pelo que posso constatar percebo que agora posso dizer que houve um tempo em que sexo era interessante. Escrevo esse texto fisicamente com essa garota, mas minha cabeça está a milhas e milhas distantes. Paralelas que se cruzam numa quitinete no Bron´x.

Um dia desses um amigo meu me disse: " Porra, vô fazer 20 anos, acho que tô ficando velho. " Respondi: " É o preço que se paga por viver a vida intensamente . "
Sempre disse que nós eramos vivos de uma forma abstrata e estaríamos sujeitos a oxidação abstrata assim como tudo que é vivo e físico. É uma lei cruel e potencialmente injusta como todas as leis. Se você gasta mais em menos tempo, a potência é maior mas acaba mais rápido. Imagina quando tivermos 40 anos, o abismo que nós separará dos caras de vinte. Maior ainda que nos separa de ontem, de antes de ontem e de dois anos atrás. Dizem que se for pra ser sem emoção é melhor ficar em casa, queremos é com emoção.

Quem são esses loucos fumantes que com 20 anos se sentem velhos ? Não sei, também não sei quem é essa garota embaixo de mim. Olho pelo céu escuro, vejo alguns garotos de rua pulando muro pra construção vazia. Não sei como me sinto mais sozinho, com essa garota embaixo de mim ou se estivesse sentado sozinho escrevendo uma carta, fosse pra loira linda de óculos ou pra quem eu um dia jurei pras folhas de cartas de amor queimadas, ser o amor da minha vida. Poderíamos ficar em casa esperando o carnaval passar, sem bossa nova sexo drogas ou rock and roll. Sem a sirene ecoando vazia contracenando a melhor novela urbana de todos os tempos da última semana. Mas "se" não entra em campo. Se eu fosse Renato Russo agora, cantaria: São apenas velhos.

7 comentários:

Yuri Montanini 24 de fevereiro de 2010 às 20:15  

Se eu soubesse antes o que sei agora, erraria tudo exatamente igual.

;*

André Safadi 24 de fevereiro de 2010 às 21:14  

Agora entendo o que você disse, mas não entendo o que é ficar velho aos 20, se deles já passei.

Gabriel Maia 25 de fevereiro de 2010 às 00:18  

"..no seu apErtamento ninguém fala com vc".
Motel de 10 barões não tem não, hein! Isso aí é drive in!

Luís Valdívia 25 de fevereiro de 2010 às 13:49  

Existe sim, Motel Beira Rio. oeAWHOEKWAHKOehWAKOH

Pedro Henrique Malta Martins 25 de fevereiro de 2010 às 14:08  

não sei vc plinio, mas nos ultimos 5 anos, com certeza vivi mais situações marcantes que na minha vida toda

Brunna Santos 2 de março de 2010 às 17:06  

Surpresa! É o que posso afirmar ao penetrar (verbo não muito coerente para as meninas. rs) o mundo virtual dos meus colegas de sala.

Deleite. Sentimento que vem à tona após ler os textos.

Agora, não os verei apenas como o "grupo dos garotos fumantes". Isso já era. Agora, os vejo como: o grupo dos garotos fumantes, que se sentem velhos após os 20 anos. Um grupo de "velhos" belos e surpreendentes intelectualmente.

Abraços da morena de óculos( e não da loira linda de óculos dos textos do Plínio, desta vez).

Brunna

Jose Pereira 19 de junho de 2010 às 22:31  

E estes jovens fumantes de 20 anos daqui a 10 anos estarão buscando os filhos e filhas na escola, atarefados e enredados nas malhas da vida.
Mas se lembrarão destes dias, em que compartilharam a idéia de que eram seres invencíveis , eternos e imortais, como a beleza da juventude, que a cada dia passa um pouquinho, até que um dia nos deparamos com nossa imagem refletida em um espelho e percebemos, brutalmente, como um soco no estômago, que envelhecemos e outros são os jovens que ocupam nossos lugares de outrora...

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